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ARTIGOS

Marketing e Comunicação

“Essa faculdade não é para mim” pode ser um revés de sua campanha elitista

Existe um pequeno profissional de marketing dentro de cada brasileiro. E esse profissional de marketing interior, provavelmente, é um Redator Publicitário.

 

Nossa vontade de avaliar e opinar títulos de campanhas, slogans e linhas criativas é, muitas vezes, maior que nosso domínio sobre o tema. O pior é quando juízos de valor mal elaborados partem de profissionais da área.

Profissionais que regram “A Uninove é 10” ou “Unip – Preferida do Mercado Profissional”, crimes contra a arte de redigir frases espertas, e esquecem que essas mesmas epígrafes foram responsáveis pela construção de dois dos maiores grupos educacionais do país e que, ao compor com outras informações, vêm conectando-se com o público-alvo dessas empresas há anos e gerando crescimento e prosperidade.

Essa é uma reflexão inicial.

 

A criação publicitária se dá sobre o repertório cultural de cada profissional. Muitos concebem para seus pares e buscam imprimir um verniz de sofisticação que pode – em muitos casos – ser contraproducente, como explicaremos.

 

Há alguns anos criamos uma campanha para um dos principais grupos educacionais do Ceará, cujo título era: “Mesmo curso, mesma sala de aula, formações totalmente diferentes”.

 

Os alunos dispunham de módulos de EAD e atividade complementar guiada, onde cada estudante fazia sua experiência ser singular. Essa mensagem não gerou o resultado esperado. A avaliação que fizemos em testes com os alunos era uma incompreensão do texto. Os resultados somente vieram quando mudamos a campanha para uma linguagem mais inteligível ao público alvo. Na ocasião um hit impregnou o Brasil com o refrão: “Tá Tranquilo. Tá Favorável”. Refizemos o título: “Dose Dupla Ateneu. Só aqui você faz a faculdade pagando menos e ganha diversos cursos de extensão. #Tá Tranquilo. Tô no Ateneu”. O sucesso foi retumbante.

 

E mudaríamos a frase e a campanha quantas vezes fossem necessárias, até encontrarmos o tom correto para aquela audiência específica.

 

Em tempos de testes A/B a criação está subordinada ao resultado. Claro que pontos de partidas refinados são necessários, e o ideal é construir uma campanha de bom gosto e sofisticação e que alcance seus objetivos. Sem jamais desprezarmos, claro, a crueza necessária de “A Uninove é 10”.

 

Uma antiga pesquisa do Instituto Data Popular, intitulada “A Riqueza na Base da Pirâmide” (mesmo título do best seller de C.K. Prahalad e Stuart L. Hart), iluminava a necessidade da criação para a base da pirâmide. Segundo o estudo, o desafio estava em se aproximar e trabalhar com uma linguagem diferente. “É preciso repensar a lógica que orienta o pensamento corporativo - até então focado para o topo da pirâmide – e afinar as classificações e critérios técnicos para que esses dialoguem com a lógica deste consumidor”, dizia o material.

 

A base da pirâmide, afinal, possui uma escolarização menos qualificada do que a elite econômica brasileira, e os criativos têm dificuldade em compreender como a dissonância cognitiva oriunda das diferenças na formação cultural, econômica, linguística e educacional, impacta na decodificação de suas peças. Peças essas que precisam compreender um vocabulário e valores muitas vezes distantes, anos luz, das descoladas redações das agências de propaganda.

 

Para início de conversa a estética é outra. A comunicação para a base da pirâmide deve considerar as referências da baixa renda, que derivam da alegre cultura popular brasileira colorida, exagerada, extravagante e farta. O argumento do “aspiracional” deve, ainda, ser relativizado. E isso é crítico e contraria 90% da criação para instituições de ensino superior.

 

Durante anos o mercado acreditou que falando para o topo da pirâmide falaria para todos. Quando o sonho é inatingível ou a linguagem inadequada, o consumidor simplesmente fala: “ISSO NÃO É PARA MIM”. Os sonhos e desejos populares nem sempre são um espelho distorcido das classes AB, o que a atrai pode afastar o publico de baixa renda, no final do dia. E um publicitário da classe AB talvez não compreenda “A Uninove é 10”. Mas seu público alvo certamente compreendeu. E o mais importante: a campanha é um case de sucesso há muitos anos.

 

Rafael Villas Bôas é Diretor de Planejamento na agência Fess'Kobbi e será palestrante no GEduc 2018, durante a XIV Jornada De Marketing Educacional.

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